Como é que nos safamos disto?

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Tanto o secretário do Tesouro, Bessent, como o do Comércio, Lutnick, foram à TV este fim de semana reforçar a ideia que as taxas alfandegárias do Dia da Libertação não só não vão criar uma recessão como vão ser espectaculares para a economia americana (se bem que o Lutnick disse que as taxas vão durar “semanas”???). O Peter Navarro, um “economista” que aconselha o Trump, diz que ninguém perde dinheiro na bolsa se não vender as ações que tem (!) e que o Dow vai chegar aos 50.000 pontos em breve. O Trump joga golfe no seu clube na Flórida e parece que está a ganhar o torneio interno. Não está claro se alguma coisa o demoverá: a popularidade? (que está a cair segundo uma empresa de sondagem de simpatias republicanas) 

A única maneira de parar a sangria desatada nas bolsas seria haver boas notícias. Ocorrem-me umas quantas, de mais provável para menos:

  • Adiar a implementação das taxas “extra” um mês ou dois: foi o que fez com o Canadá e com o México – e com a venda do TikTok que foi adiada uma segunda vez. Isto não resolve nada, mas dá fôlego e esperança se as taxas se ficarem pelos 10% uns tempos.
  • A culpa é do outro: o Trump não andou no ISEG por isso admitir o erro porque está sempre pronto a corrigi-lo não é ideia que lhe venha à mente. No entanto, dizer que os outros cometeram erros e lançá-los às feras já é mais do seu genero. Como a fórmula de cálculo das taxas “recíprocas” foi mal aplicada, gerando valores 4 vezes maiores do que devia, será que o Lutnick pode ser sacrificado e voltar tudo ao “plano original” que o Trump vai dizer que sempre teve desde o início que era 10% a todo o mundo?
  • Revolta republicana: Há sete republicanos que finalmente estão a apoiar uma medida contra este abuso de poderes do presidente. O Trump usou poderes de emergência e disse que as taxas são uma questão de segurança nacional o que é uma desculpa esfarrapada – democratas e republicanos estão a propor conjuntamente uma medida para que as decisões sobre taxas alfandegárias sejam objeto de aprovação no congresso. Será que os republicanos vão perder o medo? Até há pouco, o Elon Musk ameaçou apoiar nas eleições primárias do partido os opositores dos candidatos republicanos que não apoiassem Trump. Testando este conceito, andou a oferecer milhões a cidadãos que ajudassem na eleição de um juiz no Wisconsin e perdeu. 

Mesmo se as taxas fossem revogadas… como é que a administração se livra da fama e do proveito de serem parceiros em quem não se pode confiar e que mudam de opinião como quem muda de camisa? Quem investe num país num contexto destes?

E o que vem aí amanhã se nada acontecer na frente de batalha das taxas?

O Jim Cramer diz que amanhã vai ser comparável com a segunda-feira negra de 1987 e, apesar de ser muito divertido apontar todas as vezes que o mercado fez exatamente o oposto do que o Jim diz, desta vez pode ser que tenha razão. Por outro lado, parece que o investidor de retalho tem andado nas compras nos saldos em que os profissionais não se atreveram mas não sei se há capital suficiente para darem a volta à tendência. 

Uns acontecimentos que estão a alertar para problemas multiplicadores de impacto negativo nas cotações:

  • Vários hedge funds tiveram de produzir liquidez rapidamente quando os bancos credores dos seus empréstimos lhes exigiram mais garantias dado que o valor das suas participações caiu com o descalabro na bolsa. A obtenção de liquidez por parte destes fundos pode ter estado na origem da queda do preço do ouro na sexta-feira. Ainda antes das tarifas se falava que estes fundos poderiam precisar de uma linha de financiamento de emergência e a Fed estava a estudar o assunto. Este tipo de fundos são pouco transparentes e altamente alavancados: uma queda na bolsa pode levar a um efeito espiral.
  • As empresas em dificuldades e a dívida de risco correm o risco de não obterem re-financiamento: estas empresas, no sectores mais atingidos pelas taxas alfandegárias, viram o preço das suas obrigações cair e as taxas de remuneração exigidas para obterem empréstimos subirem. De acordo com a Bloomberg há agora 43 mil milhões de dívida em risco de não serem re-financiadas, o que poderá levar a uma explosão de falências, acelerando a possibilidade de uma recessão. O spread, a diferença de taxa de rendimento  que os investidores exigem para deter a dívida de risco em vez dos títulos do Tesouro aumentou 45 pontos base na quinta-feira.
  • O Powell do Fed não cortou os juros como o Trump pediu. Interferências no funcionamento do Fed, supostamente independente, ocasionaria ainda menos confiança na economia americana. O Trump quer juros mais baixos para financiar a reindustrialização dos EUA que ele acha que as taxas alfandegárias vão despoletar e o Powell quer os juros sossegados em caso de as mesmas taxas causarem inflação que perdure.

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o dinheiro é tão bonito

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